FANDO Y LIS:
(DES) NECESSÁRIA PALAVRA OU
A LUTA DOS QUERERES
(DES) NECESSÁRIA PALAVRA OU
A LUTA DOS QUERERES
Uma
tentativa de análise do óbvio não evidenciado ou
da evidência não óbvia
Por
PAULO
GOMES
Para começo de história, ou da tentativa dela, ouço Astor Piazzolla.
Danço diante da tela, diante da imagem que se projeta em mim do espetáculo
vivido nas luzes, nas sombras, na música, no dueto de atores que cresce pela
palavra ou pela ausência dela – as vezes a queria distante daquelas bocas,
línguas e corpos. O virtuosismo da relação que se estabelecia diante de nós no
teatro de corpos e falas, e elementos que compunham um cenário minimalista. Eis
o princípio do que vira no Avoante espaço.
Não tinha eu grandes expectativas. Tinha uma
ansiedade em saber que depois me faria eu os dedos e a mente do que viria como
o que aqui faço, uma tentativa de atropelo a minhas expectativas – não grandes.
E, com que felicidade elas seriam atropeladas...
Versejar sobre o mundo cru de Arrabal, através de
Fando y Lis, é o exercício extremo, é impor desafio ao soco no estômago que se
sente na alma depois de tê-la trucidada pelos olhos na luz atuando de forma
magistral, nas sombras, como cena a parte, como personagens dos personagens que
desfilavam as angústias todas dos mundinhos aprisionados entre as paredes das
casas que desabam cotidianamente e ninguém percebe.
Uma pausa para um pouco mais de
Piazzolla
(...)
O mundinho individualizado de cada um. Nossos
pequenos universos múltiplos a se chocarem. A não percepção do outro. Tive um fascínio
pela cena como um todo, uma união quase perfeita – não fosse a fuga para o
vazio, não permitido, senão quando requerido pela cena, de Tony Ferreira
(Fando), tive medo de não sustentar-se no personagem ou de não tê-lo como
construído em algo visivelmente sólido e presente em cena. Feliz sensação de
engano. Fando (Tony Ferreira) foi se agigantando, tornou-se a necessidade de
sê-lo, Fando, inteiro, verdadeiro, que está por se completar...
Mais uma pausa para ver meus passos
anteriores
(...)
...E a completude se materializa em Lis (Tiziane
Virgílio) que derruba a quarta parede machucando toda a plateia na sua entrega
literal ao drama. E o público, em parte, uma boa parte, está sobre o palco, nos
seus dramas cotidianos e identificáveis pela simbiótica relação que escancara o
mundo “invisível” de alguns ao mundo.
O corpo sofrido na cena, a cena castigada pelo
corpo, as sombras que se interpenetram, as luzes a castigar nossas poéticas
janelas para alma – e como eram castigadas. Agonia e êxtase. Hora éramos,
também acariciados, hora éramos feridos em tudo que nos existe e nos faz ser.
Tiziane (Lis) era cada pessoa ali presente e ao mesmo tempo ninguém que ali
pudesse estar. Doía toda a angústia perpassada na fala e quando ela também não
estava lá. Lis (Tiziane) trazia em si a dança de palavras e a ausência delas
saltava aos nossos olhos como a perfura-los naquele quase infindável ciclo de
idas e vindas que o drama (nosso de cada dia?) perpetuava no tempo transcorrido
do qual nos desapercebíamos.
Enfim, mágica experiência de poder vivenciar os
vários elementos dramatúrgicos de um espetáculo teatral vivo e intenso, mesmo
na sua repetitividade e na sua busca constante de encenação, em sua concepção e
desenvolvimento, de possibilidades variáveis de se dizer o mesmo que já foi
dito. Mas nisso também reside nossa natureza humana. E nisso reside nossa
necessidade de nos vermos cada vez mais e mais em experiências todas que o
Avoante possa nos proporcionar sob suas asas.
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