segunda-feira, 10 de agosto de 2015

FANDO Y LIS: (DES) NECESSÁRIA PALAVRA OU A LUTA DOS QUERERES




FANDO Y LIS:
 (DES) NECESSÁRIA PALAVRA OU
 A LUTA DOS QUERERES

Uma tentativa de análise do óbvio não evidenciado ou 
da evidência não óbvia



Por PAULO GOMES



Para começo de história, ou da tentativa dela, ouço Astor Piazzolla. Danço diante da tela, diante da imagem que se projeta em mim do espetáculo vivido nas luzes, nas sombras, na música, no dueto de atores que cresce pela palavra ou pela ausência dela – as vezes a queria distante daquelas bocas, línguas e corpos. O virtuosismo da relação que se estabelecia diante de nós no teatro de corpos e falas, e elementos que compunham um cenário minimalista. Eis o princípio do que vira no Avoante espaço.

Não tinha eu grandes expectativas. Tinha uma ansiedade em saber que depois me faria eu os dedos e a mente do que viria como o que aqui faço, uma tentativa de atropelo a minhas expectativas – não grandes. E, com que felicidade elas seriam atropeladas...

Versejar sobre o mundo cru de Arrabal, através de Fando y Lis, é o exercício extremo, é impor desafio ao soco no estômago que se sente na alma depois de tê-la trucidada pelos olhos na luz atuando de forma magistral, nas sombras, como cena a parte, como personagens dos personagens que desfilavam as angústias todas dos mundinhos aprisionados entre as paredes das casas que desabam cotidianamente e ninguém percebe.



Uma pausa para um pouco mais de Piazzolla

(...)



O mundinho individualizado de cada um. Nossos pequenos universos múltiplos a se chocarem. A não percepção do outro. Tive um fascínio pela cena como um todo, uma união quase perfeita – não fosse a fuga para o vazio, não permitido, senão quando requerido pela cena, de Tony Ferreira (Fando), tive medo de não sustentar-se no personagem ou de não tê-lo como construído em algo visivelmente sólido e presente em cena. Feliz sensação de engano. Fando (Tony Ferreira) foi se agigantando, tornou-se a necessidade de sê-lo, Fando, inteiro, verdadeiro, que está por se completar...



Mais uma pausa para ver meus passos anteriores

(...)



...E a completude se materializa em Lis (Tiziane Virgílio) que derruba a quarta parede machucando toda a plateia na sua entrega literal ao drama. E o público, em parte, uma boa parte, está sobre o palco, nos seus dramas cotidianos e identificáveis pela simbiótica relação que escancara o mundo “invisível” de alguns ao mundo.

O corpo sofrido na cena, a cena castigada pelo corpo, as sombras que se interpenetram, as luzes a castigar nossas poéticas janelas para alma – e como eram castigadas. Agonia e êxtase. Hora éramos, também acariciados, hora éramos feridos em tudo que nos existe e nos faz ser. Tiziane (Lis) era cada pessoa ali presente e ao mesmo tempo ninguém que ali pudesse estar. Doía toda a angústia perpassada na fala e quando ela também não estava lá. Lis (Tiziane) trazia em si a dança de palavras e a ausência delas saltava aos nossos olhos como a perfura-los naquele quase infindável ciclo de idas e vindas que o drama (nosso de cada dia?) perpetuava no tempo transcorrido do qual nos desapercebíamos.

Enfim, mágica experiência de poder vivenciar os vários elementos dramatúrgicos de um espetáculo teatral vivo e intenso, mesmo na sua repetitividade e na sua busca constante de encenação, em sua concepção e desenvolvimento, de possibilidades variáveis de se dizer o mesmo que já foi dito. Mas nisso também reside nossa natureza humana. E nisso reside nossa necessidade de nos vermos cada vez mais e mais em experiências todas que o Avoante possa nos proporcionar sob suas asas.



Por favor, Piazzolla, e Fando y Lis, e as luzes, e as sombras, o pedaços todos em cena...





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